Diante de numerosas críticas publicadas por veículos da imprensa nacional sobre a participação de juízes em eventos patrocinados ou subsidiados por pessoas físicas ou empresas privadas — inclusive festas com direito a sorteio de automóveis, geladeiras, cruzeiros, viagens internacionais, hospedagem em resorts —, a Ministra Eliana Calmon, à época Corregedora Nacional de Justiça, deu o primeiro passo à criação da Resolução nº 170/2013, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Em geral, essa Resolução determina que todos e quaisquer congressos, seminários, simpósios, encontros jurídicos e culturais e eventos similares realizados, promovidos ou apoiados por entidades ligadas à administração da Justiça poderão contar com subvenção de entidades privadas com fins lucrativos (empresas), desde que explicitado o montante do subsídio, que não deverá ultrapassar o limite de 30% dos gastos totais.
A Resolução também (I) estabeleceu que somente os custos daqueles juízes que compareçam no evento na qualidade de palestrante, conferencista, presidente de mesa, moderador, debatedor ou organizador poderão ser subsidiados; e (II) vedou o recebimento por juízes, a qualquer título ou pretexto, de prêmios, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, salvo pelas exceções previstas em lei.
O pano de fundo da Resolução nº 170/2013, como se pode imaginar, é a preservação da conduta irrepreensível de juízes na vida pública e particular, bem como a manutenção da imparcialidade inerente à profissão, de maneira que sejam minimizadas eventuais alegações de conluio entre particulares e juízes, tal como a externada em plenário pelo Ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal (STF). Nada mais razoável para o interesse da sociedade e da própria magistratura, parece-me.
No entanto, essa não é a opinião da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages) e da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), para quem os controles acima mencionados não seriam ética ou legalmente justificáveis. Ambas associações ajuizaram ação perante o STF visando à suspensão imediata da Resolução. Sem sucesso.
Em seu recentíssimo voto, de 8 de julho de 2013, o Ministro Celso de Mello, do STF, não somente negou as liminares requeridas por Anamages e Ajufe, como apregoou diretrizes de conduta – já estabelecidas em lei, registre-se – que, com alguma sorte, ecoarão nos mais longínquos gabinetes espalhados pelo país.
Em seu entendimento, “A ordem jurídica não pode permanecer indiferente a condutas de quaisquer autoridades da República, inclusive juízes, que hajam eventualmente incidido em reprováveis desvios éticos no desempenho da elevada função de que se acham investidas. (…)
Daí a necessidade de atenta vigilância sobre a conduta pessoal e funcional dos magistrados em geral, independentemente do grau de jurisdição em que atuem, em ordem a evitar – tal como objetiva a Resolução em causa – que os juízes, recebendo, de modo inapropriado, auxílios, contribuições ou benefícios de pessoas físicas, de entidades públicas ou de empresas privadas, inclusive daquelas que figuram em processos judiciais, desrespeitem os valores que condicionam o exercício honesto, correto, isento e independente da função jurisdicional.”
Ambas associações podem insistir. A questão é: vale a pena?
Por Guilherme Abdalla, advogado, mestre em filosofia e teoria geral do direito pela USP
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