O Brasil voltou a depender dos especuladores internacionais para compensar o dinheiro que sai do país com importação de bens e serviços.
No primeiro semestre, saíram das nossas fronteiras US$ 3 bilhões por meio do comércio (exportações menos importações), US$ 22 bilhões por meio de serviços prestados no exterior (como viagens) e US$ 20 bilhões na forma de rendas, de acordo com dados do Banco Central. Por outro lado, entraram US$ 2 bilhões por meio de remessas feitas por brasileiros que moram no exterior.
Esses quatro números formam o grupo de dados que o Banco Central chama de transações correntes. Em conjunto, essas operações ficaram negativas em US$ 43 bilhões no primeiro semestre, ou seja, essa foi a quantia que deixou o país por meio do comércio de bens e serviços, por meio de renda e das remessas feitas por pessoas físicas.
Nos últimos anos, o deficit das transações correntes não trazia problemas para o país porque, ao mesmo tempo em que esse dinheiro saía, entrava uma quantia muito maior na forma de investimento estrangeiro direto (investimento em produção, como construção e reforma de fábricas).
Na primeira metade deste ano, no entanto, isso mudou. Os investimentos diretos líquidos somaram US$ 37 bilhões. Ficaram faltando, portanto, US$ 6 bilhões para compensar o deficit nas transações correntes. Essa diferença foi coberta pelo capital especulativo, aqui entendido como os investimentos que não vão para o setor produtivo, e sim para o mercado financeiro (por exemplo, títulos de renda fixa).
A última vez em que o país teve que recorrer a especuladores internacionais para equilibrar as contas externas em um semestre foi na primeira metade de 2010.
O gráfico abaixo mostra a necessidade de capital especulativo do país em cada ano. Quando o resultado é negativo, significa que as transações correntes e os investimentos diretos foram mais do que suficientes para trazer dólares ao país, de modo que nesses casos não dependemos de capital em setores não produtivos.
Como se pode ver, desde a década de 2000 foram raras as vezes em que o gráfico deu positivo, ou seja, em que precisamos recorrer a capital especulativo para equilibrar as contas externas.
Os brasileiros precisam de dólares porque o real não é uma moeda aceita mundialmente. Quando compramos algum bem importado, normalmente temos que usar a moeda americana.
Quando o dólar está em falta, a cotação sobe. Ou então o Banco Central vende parte das suas reservas, mesmo que com compromisso de recomprar no futuro. Para não queimar reservas, é bom que entre no país pelo menos a mesma quantidade de dólares que sai. Ou seja, as contas externas precisam ficar equilibradas.
Historicamente, as contas externas são um desafio importante na economia brasileira. Já estivemos melhor do que hoje, mas também já tivemos fases bem piores.
Hoje, o Brasil voltou a depender de capital especulativo, mas pelo menos os especuladores ainda colocam dinheiro aqui. No final da década de 1990, ao contrário, o país não só não atraía investimento direto suficiente como também não convencia nem os especuladores.
Em 1998, por exemplo, saíram do país US$ 33 bilhões nas transações correntes. Juntos, os investimentos diretos (que ficaram em US$ 26 bilhões) e o capital estrangeiro não produtivo (US$ 4 bilhões) chegaram apenas a US$ 30 bilhões. Faltaram, portanto, US$ 3 bilhões para fechar a conta.
O resultado foi a queima de grande parte das reservas internacionais do país (pressionada não só por esses resultados, mas também pelas especulações contra o real, gerando uma bola de neve).
De 1996 a 2000, tais reservas caíram praticamente à metade, como aponta o gráfico abaixo. Só voltaram a subir com força a partir de 2006 (e no início de 2013 voltaram a ter leve queda).
Hoje, no entanto, os preços das matérias-primas não sobem mais, só que as importações continuaram aumentando. Nós passamos de um superávit de US$ 3 bilhões na balança comercial, no primeiro semestre do ano passado, para um déficit de US$ 7 bilhões na primeira metade de 2013.
Os investimentos estrangeiros diretos continuam altos, mas não o suficiente para cobrir o crescente déficit nas transações correntes, que aumentou de US$ 25 bilhões nos seis primeiros meses de 2012 para nada menos que US$ 43 bilhões em período equivalente de 2013.
Nos restou a sede dos especuladores. Para não descermos mais um degrau, voltando à situação do final da década de 1990, em que nem os especuladores queriam colocar dinheiro no país, é preciso que nossa economia se torne mais atraente para os investidores do setor produtivo ou mais favorável para os exportadores.
Nesse aspecto, temos duas boas notícias. A recente desvalorização do real pode tornar nossa indústria mais competitiva, favorecendo as exportações e também melhorando a capacidade de concorrer com os produtos importados. Ainda, os leilões de infraestrutura, se obtiverem sucesso, devem trazer grandes investimentos estrangeiros ao país.
Mas o câmbio, sozinho, não resolve, segundo diversos economistas têm afirmado. Primeiro porque a queda do real pode gerar inflação, uma vez que os importados ficam mais caros. Depois, porque o custo dos produtos nacionais precisa cair. Isso pode ser feito, entre outras coisas, pela redução da carga tributária (que, por sua vez, exigiria maior controle de gastos públicos).
Por último, é preciso que o mercado internacional ajude. A Europa, um dos grandes clientes dos exportadores brasileiros, está afundada em uma crise. A China, que compra nossas matérias-primas, vive uma desaceleração.
Como disse Samuel Pessôa, da FGV, no Valor: “A vida do próximo presidente será dura”. Diria mais, que a situação de Dilma Rousseff já não está fácil.
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