Nas últimas semanas testemunhei pessoalmente o impacto das manifestações de rua e das greves gerais no Brasil e em Portugal — respectivamente o país onde moro há 5 anos e o meu país natal.
Ainda que por razões bem distintas, os protestos de rua nestes dois países constituem um sinal claro do mal-estar que estava latente na sociedade, agora totalmente posto às claras.
No seio deste clamor por mudança a pergunta que fazemos é: e na gestão das empresas não é necessária uma mudança vigorosa de paradigmas?
Reforcei esta convicção ao conhecer os resultados do trabalho de investigação dos professores Nicholas Bloom (Stanford), Raffaella Sadun(Harvard) e John van Reenen (London School of Economics).
Estes três acadêmicos analisaram as práticas de gestão de 8000 empresas em 20 países (“Management practices across firms and countries” e relacionados). Os resultados são expressivos, tanto para Brasil como para Portugal. Uma constatação do estudo, que me chama particularmente a atenção, é a de que os gestores brasileiros e portugueses se consideram muito melhores do que a realidade mostra.
Na auto-avaliação das práticas de gestão os gestores portugueses apareceram em quinto lugar e os gestores brasileiros em primeiro lugar.
No entanto, na pesquisa sobre as práticas de gestão as empresas portuguesas descem para o 14º lugar e as brasileiras para o 18º, num total de 20 países. Mas este enviesamento de análise não é exclusivo de brasileiros e portugueses.
No total da amostra, 79% dos gestores consideram que estão acima da média na avaliação das suas práticas de gestão. A lista de boas práticas é liderada pelos Estados Unidos, Japão, Alemanha, Suécia e Canadá. Mas mesmo nos Estados Unidos, que lideram este ranking, apenas 15% das empresas pontuam no topo da escala (acima de 4,numa escala de 1 a 5).
No total da amostra esta percentagem baixa para 5%. Para Nicholas Bloom e seus colegas há quatro fatores que favorecem a boa gestão: (1) concorrência, (2) globalização, (3) capital humano e (4) flexibilidade do mercado de trabalho.
Concluíram que existe uma correlação positiva entre a qualidade das práticas de gestão e o número de concorrentes enfrentado, a presença multinacional, a qualidade e formação do capital humano e a flexibilidade da regulamentação do mercado de trabalho.
Mostraram também que a qualidade da gestão está associada a maior retorno sobre capital empregado, maior produtividade, maior capitalização e maior crescimento das vendas e da participação de mercado.
Este estudo sugere-nos que os problemas estruturais que enfrentamos atualmente na economia brasileira (e também na portuguesa) são acompanhados por um déficit na qualidade da gestão. A crise atual não é apenas política.
Empresários e gestores fazem parte da realidade que as ruas denunciam. É preciso humildade para reconhecermos esta realidade sem desculpas; é preciso determinação para fazermos as mudanças que são necessárias; é preciso criatividade para inovarmos nas práticas de gestão (podemos sempre copiar os americanos, mas este é o momento em que o mundo está ávido por novos modelos). É preciso um choque de gestão!
Por Miguel Setas, vice-presidente da EDP no Brasil
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