Aproveitando o mês de julho, decidi que talvez fosse a hora de rever minha afeição pelo Estado de São Paulo. Confesso que em casa a gente nunca ligou muito para a ”revolução constitucionalista” e suas consequências. Como parte da família é de outro Estado, sempre tive muitas ressalvas com o sentimento bandeirante. Não foram uma ou duas vezes que presenciei frases racistas e xenófobas saindo de bocas das classes altas locais. Assim, pensar sobre a paulistanidade sempre foi, antes de qualquer coisa, um exercício de paciência.
Mas diante dos últimos acontecimentos, acho que seja a hora de mudar de ponto de vista. Com as recentes denúncias nos jornais e depois de alguma reflexão cheguei a uma nova conclusão. Ao contrário de diminuir o “espírito bandeirante”, eu deveria mesmo é exaltá-lo. Não por ser a “locomotiva do país” ou por “São Paulo ter tudo”. Nem pelo povo interiorano avançado, que defende os melhores valores do século XVI. Tampouco o eficientíssimo sistema de transporte público ou do elevado nível de urbanismo da capital.
O que me deveria fazer acreditar na superioridade paulista é ter certamente o melhor serviço público do país. Na verdade, estou sendo injusto. As pessoas que controlam o nosso sistema público devem estar entre os mais honestos do mundo.
Sim porque em todos os casos de desvio de dinheiro público neste Estado, nunca há um político do governo envolvido. É impressionante. Ao contrário do mensalão, onde cem milhões de reais foram desviados à custa de um maquiavélico sistema de corrupção, as concessionárias de pedágios superfaturaram seus lucros em dois bilhões de reais sem a participação de nenhum figurão do governo.
Mas este não foi o único caso em São Paulo que povoou o noticiário desta semana. Há pouco, ficou-se sabendo que existe um esquema de superfaturamento nos contratos do metrô possivelmente iniciado em 1998. De novo, no engenhoso cartel internacional não há o conhecimento de participação de nenhum político. Ninguém dentro do governo parece ter relação com as centenas de milhões superfaturados ao longo de anos.
O bizarro é que enquanto escrevia, vi um bloco inteiro do Jornal da Globo destinado a mostrar um esquema de superfaturamento no sistema de internet livre de João Pessoa. Segundo o isento jornal, o arranjo foi desenhado para nunca funcionar. A empresa só serviria para desviar dinheiro ao grupo do governador do Estado, cuja monta parece estar na casa do milhão de reais.
Não estou incriminando ou defendendo o governo da Paraíba. Só estou lembrando que a regra geral de casos onde empresas privadas superfaturam obras ou serviços públicos é que exista um político por trás (ou na frente, sei lá). Não que seja a totalidade dos eventos de corrupção, mas certamente são bastante recorrentes no Brasil situações onde o desvio alimenta algum esquema, especialmente os eleitorais.
Porém, pela leitura dos fatos, parece que não preciso me preocupar com São Paulo. Em todos esses anos de governo sob o mesmo partido, não há uma única história de desvio de verbas públicas que envolvam seus líderes políticos. Por sinal, toda essa retidão deve mesmo ser coisa de paulista. Afinal os políticos do partido que governam há 18 anos, eram antes de outro partido. São agentes insuspeitos, ainda que o antigo partido tenha sido por outros oito anos, governo.
São Paulo é um caso único no Brasil diga-se. Sim, porque nos que a mídia gosta de investigar, raramente existem corruptores. Nos jornais só existe espaço para os corruptos, especialmente se o caso vier do governo federal. Já aqui ocorre o oposto: só existem os corruptores. Não há agentes públicos mal intencionados, ainda mais na cúpula do governo.
Sugiro inclusive, que uma vez no Brasil, o Papa se aconselhe com o governador, já que até o Vaticano não escapa imune de casos de corrupção onde sua cúpula esteja envolvida.
É verdade que vez ou outra falta uma cobertura jornalística um pouco mais aguerrida. As notícias aparecem, mas nunca se tornam um bloco inteiro do Jornal da Globo. Nunca há um questionamento sobre a ausência do Palácio dos Bandeirantes neste tipo de festa. Aliás, para não ser injusto, sempre aparece uma ou outra capa de jornal, que invariavelmente se tornarão o banheiro dos cachorros de amanhã.
Para não dizerem que estou sendo muito bairrista, faço apenas uma ressalva: há sim uma banda podre dentro do Estado. Com todo este cenário, me parece que toda a corrupção paulista deve se concentrar no empresariado estadual. Como nunca há agentes públicos envolvidos, penso que o mais correto seria a Polícia Civil, que vive dias de glórias sob o governo tucano, grampear toda a FIESP. Sim, porque todo o mal do Estado reside na insidiosa classe empresária. Esta sim parece ser a grande vilã paulista.
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