segunda-feira, 29 de julho de 2013

Reforma política e reforma eleitoral: A história nos leva à desconfiança

Não é de hoje que se fala em reforma política e reforma eleitoral e agora após variadas agitações urbanas, que deram feições novas à mesmice habitual das muitas cidades, praticamente em todos os Estados; em consequência o Congresso teve pressa em adotar medidas no que tange à tramitação parlamentar ou ao funcionamento do Poder Legislativo, até  onde vai o meu conhecimento do assunto, à luz do que foi divulgado, as questões que despertaram a atenção congressual  nem de longe resultaram da experiência acumulada, tanto assim, que jamais haviam sido arroladas como desnecessárias ou inconvenientes; parece terem sido uma espécie de tributo pago aos noticiários do dia, que estariam a indicar velharias intoleráveis.
Dou um exemplo: passando os olhos pela Constituição, vejo que em dúzia de vezes nada se lê que nos casos que indicam votação da Câmara ou do Senado, seria tomada em escrutínio secreto. Seria de indagar porque tradicionalmente a norma Constitucional exige que a decisão se desse mediante votação secreta. A regra geral era no sentido das decisões parlamentares, fossem públicas; excepcionalmente elas haveriam  de ser “em escrutínio secreto”.
Os casos excepcionais são poucos creio não passariam de meia dúzia e, em sua maioria, em favor do Legislativo e no sentido de limitar o Executivo. E teriam sido apagados todos os casos de votação secreta, na Câmara e no Senado. Todos. Dou um exemplo:  O voto a projeto de lei, mesmo que aprovado pela maioridade da Câmara e do Senado, só pode ser rejeitado pela maioria absoluta dos deputados e senadores, em escrutínio secreto”. Por que? Para que o Executivo, com todas suas múltiplas ramificações, não poderiam pressionar parlamentares, a lei cuida de assegurar a votação secreta, como se não bastasse a maioria absoluta, ou seja, a maioria da Câmara e do Senado. O expediente é eficaz? Não sei, sei apenas que busca assegurar aos parlamentares plena independência ao votar, como sei que a lei pode muito mas não pode tudo.
Fico por aqui no que tange à reforma política e passo à reforma eleitoral. Parece que o ato congressual foi a abolição dos suplentes ou do segundo suplente. Diga-se de passagem, que nem sempre houve a figura do suplente de senador e quando vagava o Senado, por uma renúncia ou perda de mandato, ou pela nomeação para ministro de Estado, deveria haver eleição para preencher a vaga, até porque dado o número de senadores em consequência obrigatória da Federação e da igualdade dos Estados, embora fossem grandes ou pequenos, populosos ou de baixa população os Estados. Foi a Constituição de 34 que instituiu a figura do suplente para substituir o titular em caso de impedimento ou sucedê-lo em caso de vacância.  De resto, nunca se questionou sua conveniência. Eliminar o suplente como necessidade a justificar uma reforma eleitoral, a meu juízo, é um contrassenso. A verdade é que a Constituição é expressa: “cada Senador será eleito com dois suplentes”. Embora a solução consagrada não seja um dogma uma coisa é certa, a sua eliminação não justifica uma reforma eleitoral.
Um pormenor que não pode ser omitido é que o nosso sistema eleitoral é um dos segmentos que mais tem se aperfeiçoado, em anos sucessivos. Em verdade, se durante o Império as eleições não eram modelares e a adoção da eleição direta implantada quando o Conselheiro Saraiva era o presidente do Conselho representou um progresso histórico, foi constante a preocupação do Imperador no sentido de aprimorar o sistema vigente. Adotada a República os abusos se multiplicaram.  É de lembrar-se, desde logo, ser então estadual a legislação eleitoral e isso ensejava demasias ainda mais nocivas. O certo é que o Partido Republicano, embora em crescimento, estava longe de competir com o Liberal e o Conservador.
A propósito, lembro na última eleição realizada no segundo reinado, os republicanos elegeram apenas três deputados, como é sabido Campos Salles era um deles. Nesse quadro os republicanos beneficiados com a surpresa de 15 de novembro temiam que os antigos monarquistas aderindo à República pudessem facilmente assumir os postos de direção. Por mera reminiscência  recorde-se que Rodrigues Alves e Afonso Pena, um conservador e o outro liberal, vieram a ser eleitos presidentes da República no primeiro decênio do século 20.
De qualquer sorte parece-me oportuno ressaltar que a despeito dos muitos acidentes institucionais que macularam a história da Nação, é  forçoso reconhecer que a Justiça Eleitoral permaneceu incólume, nos 20 anos de bastardia republicana e democrática. E, além disto, é inegável que a partir do longo período do Estado Novo, foram vários os  aperfeiçoamentos  aditados  ao Código Eleitoral como a adoção da cédula oficial, o acesso ao rádio e à televisão gratuitos, a participação no fundo partidário e a urna eletrônica.
De modo que o risco da reforma projetada importar em clamoroso retrocesso não me parece hipótese gratuita.
Por Paulo Brossard, jurista e ministro aposentado do STF

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