Por Marco Cuadros, administrador, teólogo, escritor e palestrante
Vivemos em um mundo competitivo. Vantagem competitiva, criatividade e inovação, desenvolvimento humano são expressões de impacto que dia a dia ouvimos dentro e fora das organizações, em seminários, congressos e até em universidades. É como se todos desejassem estar na vanguarda do conhecimento e acreditassem que pronunciando as palavras da moda fossem levados diretamente ao topo.
Muitos anos se passaram desde que a primeira faculdade apareceu no Brasil. Criada só com a chegada da família real portuguesa, a Fameb (Faculdade de Medicina da Bahia) foi fundada em 18 de fevereiro de 1808, e hoje, pertence à Universidade Federal da Bahia. Foi a partir de 1808 que milhões de pessoas passaram por uma grade de estudos estruturada com o intuito de melhorar seus conhecimentos e, principalmente, estar melhor preparados para enfrentarem os desafios da vida profissional. Com o passar dos anos, o ensino superior se popularizou de maneira tal que hoje é imperativo que todos os jovens ingressem para o mercado de trabalho com pelo menos um curso universitário concluído.
E isso não para por aí. Jovens que se formam aos 22 ou 23 anos pensam em fazer uma especialização ou MBA aos 25 ou 26 anos para depois, quando já tiverem alcançado uma “maturidade profissional” de 15 ou 20 anos de experiência trabalhando em alguma empresa, pensar no pós-carreira através da prática do ensino universitário. É nesse momento, aos 45 ou 50 anos de idade que as pessoas começam a pensar em um mestrado ou doutorado para impulsionar suas carreiras como professores universitários (isso se o talento para essa atividade for descoberto e/ou reconhecido).
Será que como profissionais preocupados com a produtividade de nossas organizações, damos o verdadeiro valor aos estudos mais avançados? De que maneira é considerado hoje pelo RH de nossas empresas um profissional quando descobre em seu currículo uma linha com o título de “Mestre em” ou “Doutor em”?
No geral, a visão empresarial na América Latina ainda é, desafortunadamente, limitada quando se deparam com profissionais com mestrado ou doutorado. Considera-se a universidade ou o ensino acadêmico como o único campo de trabalho de um mestre ou doutor. Acredita-se, de forma equivocada, que esses níveis acadêmicos limitam um profissional a uma biblioteca, transformando-o em um “roedor de livros” e portanto, não preparado para fazer parte da rotina de uma organização, quanto às pressões e desafios para alcançar um único objetivo: o lucro.
Esses níveis de estudo não estão unicamente direcionados para o meio acadêmico, mas também para o segmento comercial e industrial, ou seja, as organizações. Tanto o mestrado quanto o doutorado atestam que um determinado profissional tem a capacidade de solucionar problemas complexos e trabalhar com soluções inovadoras com um nível de dificuldade altíssimo. A análise crítica e a “cosmovisão empresarial” é muito mais desenvolvida em profissionais com este tipo de preparação do que a visão daqueles que não tiveram esta oportunidade. E como a complexidade de raciocínio acompanha o profissional independente de sua área de atuação, não existe grande dificuldade para esses profissionais assumirem tarefas complexas nas organizações. Esta visão é justamente aquela apresentada pelas grandes corporações nos Estados Unidos. É fácil encontrar um mestre ou doutor trabalhando em uma empresa estadunidense. Eles estão ali para encontrar soluções complexas e, principalmente, gerar conhecimento estruturado que a organização considere como diferencial. E são muito valorizados por isso!
Como enxergar, portanto, a falta de profissionais muito bem preparados academicamente nas organizações? Algumas razões que tentam explicar essa situação são as seguintes:
Poucos profissionais preparados. Em novembro de 2010, a National Science Foundation divulgou que em 2009, os Estados Unidos tiveram 49.562 novos Ph.D.s. Segundo a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), 12 mil pessoas receberam o título de doutor no Brasil em 2010, enquanto foram mais 17 mil doutores no Japão e 36 mil na China. No Brasil, atualmente são poucos os profissionais bem preparados, especialistas, com conhecimento bem estruturado e atestado por uma universidade. Como consequência, esses profissionais suprem principalmente a demanda das universidades e dos programas de MBAs deixando para trás as oportunidades nas organizações.
Líderes sem preparação adequada. Se os líderes não estiverem bem preparados, não haverá uma proximidade natural com profissionais que estejam mais preparados do que eles. A visão desses líderes continuará em desvantagem e, por conseguinte, ótimos profissionais deixarão de ser contratados.
Visão equivocada do RH. Certa vez conversava sobre o ato de estudar com um gerente de RH de uma empresa em São Paulo. Ele me disse: “Para que estudar tanto? Muito conhecimento atrapalha e impede que as decisões sejam tomadas com agilidade”. Unicamente as pessoas que têm muito conhecimento (seja por estudo ou por experiência) entendem o valor do conhecimento na tomada de decisão. Exemplo disso são os gerentes sêniores, os diretores e os presidentes que, com todo o conhecimento adquirido com estudo e experiência conseguem tomar agilmente decisões que influenciam o rumo de toda uma organização.
Falta de incentivo financeiro. É provável que as empresas não estejam dispostas a pagar um valor maior por um profissional com mais preparação do que outro, mesmo sabendo da grande vantagem que esse profissional poderá acrescentar à empresa. Ainda bem que em alguns casos isso não é uma realidade. Existem empresas hoje, como a Chemtech, que tem um sistema de incentivo de estudo para seus funcionários bem estruturado (140 horas de treinamento continuado por funcionário), e cuja universidade corporativa oferece Mestrado e MBA tanto para funcionários como para as pessoas que estão fora do ambiente corporativo. Assim, os colaboradores adquirem crescimento pessoal e, por conseguinte, crescimento profissional. Este tipo de empresas tem uma visão inovadora pois sabem que quanto mais desenvolvido for o profissional, mais desenvolvida será a empresa e melhores oportunidades enxergará no mercado.
As empresas não mudarão sua visão da noite para o dia ou em pelo menos 5 ou 10 anos, mas com a popularização dos estudos através da internet, a facilidade para estudar em universidades do mundo todo e a exigência cada vez maior de conhecimentos para ingressar no mercado de trabalho, a tendência será a popularização dos cursos de mestrado e doutorado e a inevitável absorção desses profissionais mais bem preparados pelas empresas. O diferencial, portanto, estará nas empresas que recrutem esse tipo de profissional primeiro e/ou incentivem o estudo de cursos mais robustos para o desenvolvimento pessoal de seus funcionários. Como consequência, as empresas com mais pessoas preparadas e aculturadas obterão os melhores resultados frente aos desafios do século XXI. Vale a provocação: como empresas, estamos prontos para absorver este tipo de profissionais?
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