Por Paulo Rabello de Castro, economista, Presidente do Conselho de Economia da Fecomercio e do Lide Economia
Mas há algo grande em Chipre: os depósitos bancários, por ser o país uma espécie de paraíso fiscal.
Os depósitos nos bancos cipriotas são mais de gente de fora da ilha, especialmente russos e britânicos, que querem escapar da fiscalização rigorosa em outras praças ou de impostos.
Nenhum desses aspectos era novo para as autoridades europeias. Usar o momento delicado das finanças da ilha para tentar “endireitar” o mau uso das vantagens tributárias dadas aos depositantes é uma estupidez completa.
Acontece que o Chipre não tem como saldar sua dívida pública, a chamada dívida soberana. Uma “ajuda oficial” de € 10 bilhões foi imaginada pela Troika (FMI, BCE e Comissão Europeia) para rolar a dívida de muito mais de 100% do PIB da ilha.
Mas, para isso, se imaginou obrigar os depositantes, até então isentos de impostos, a “colaborarem” com um tributo especial de 9,9% ou de 6,75%, dependendo do tamanho do depósito.
Não passa de um confisco de surpresa. A alternativa seria aumentar impostos, como argumentou a Troika. Mas o Parlamento cipriota decidiu, na terça-feira, rejeitar tanto o confisco como o pacote, com um detalhe interessante: nenhum voto a favor do que fora proposto.
Os parlamentares salvaram a ilha do vexame de cair de joelhos perante os credores. Mas o impasse está criado.
O mais surpreendente no episódio é o total despreparo da Troika em lidar com um problema dessa natureza. Se tivessem consultado a história recente do Brasil (com o bloqueio de depósitos da era Collor/Zélia Cardoso) ou da Argentina (com seus confiscos bancários e corralitos), algo teriam aprendido sobre como fazer, ou melhor, não fazer.
Para fazer, a autoridade não pode perguntar, mas, sim, criar o caso consumado, como fez Collor via medida provisória e, em seguida, amargar o altíssimo custo político da medida e, no caso brasileiro, o custo econômico de haver cometido monumental equívoco com o bloqueio, que lhe custou o cargo mais tarde. Melhor não fazer, assim decidiram os deputados cipriotas.
Mas o mal já está feito. A Troika mandou o pior recado possível a todos os depositantes da zona do euro, o de que seus depósitos estariam sujeitos, em situações-limite, a uma perda inesperada.
O pior é a inutilidade da medida em si. Façamos conta rápida: com PIB de € 18 bilhões/ano e caindo, o Chipre não tem como saldar seus compromissos futuros, com ou sem confisco, que daria uma injeção de € 7 bilhões, uma só vez, aos cofres públicos.
A Troika escolheu o pior dos mundos: nada resolveu quanto à inevitável renegociação geral das dívidas cipriotas e ainda lançou o vírus da desconfiança sobre 100% dos demais depositantes no restante da atribulada zona do euro.
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