sexta-feira, 12 de abril de 2013

Maioridade penal e a discussão infantil

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uponhamos que você acordou em sua cama, nesta sexta-feira, como de costume. Ao ligar a TV, a primeira notícia que você tem é: a maioridade penal no Brasil passou hoje a ser de 16 anos de idade. Você, conservador à lá Veja, dá pulos de alegria. Pensa logo que os problemas com o crime estarão resolvidos. A partir de agora, menores que servem de assassinos nas quadrilhas, irão mofar em nossas masmorras. A impunidade estará resolvida, pois, esses monstros em forma de adolescentes pensarão duas vezes antes de cometer algum crime.
Penso que não preciso me estender. Ler estas afirmações com calma, para qualquer um minimanete racional, mostra como o debate sobre a maioridade penal é idealizado. Mudar a idade mínima para o encarceramento em si, não muda nada. Até porque nosso modelo já prevê o encarceramento de jovens em conflito com a lei a partir dos 12 anos. Aos indignados com o presente, lembro que mudar a lei só servirá aos crimes futuros, não aos que aconteceram até ontem.
O último assassinato que ganhou destaque na imprensa parece ter sido cometido por um menor de idade. Uma tragédia que só mostra como seguimos vivendo na barbárie. Como “resposta”, surgem projetos de lei apoteóticos e frases de efeito, como a do governador de São Paulo.
Acho fantástico como o brasileiro tem o poder de tentar resolver um problema criando outro.
Vamos voltar ao começo deste post. Alguém sinceramente acha que nosso sistema prisional comporta a redução da maioridade penal? De verdade, alguém ainda acha que o sistema prisional serve a alguma coisa? Com um índice de reincidência na casa dos 70%, nossas prisões não punem nem ressocializam. Só servem para acumular gente.
Mas isso não é tudo. Os Estados Unidos, país-referência para a classe média brasileira, é referência também por ter falhado no combate à delinquência juvenil. Na verdade, eles têm outro problema mais sério, a questão prisional. Com a maior população carcerária do mundo, o país não vê mudanças significativas em suas taxas de criminalidade. Por isso, devolvo mais uma pergunta: se o que dá certo é prender todo mundo, por que lá não funcionou?
Voltando à nossa realidade, sugiro que o debate sobre a maioridade penal comece do início. Com a cabeça fria, precisamos identificar onde surgem as condições para que crimes bárbaros como o do estudante da Cásper Líbero aconteçam.
Antes, lembro se tratar de uma escolha política. Mudar a legislação ou atacar as raízes do problema são ações que trarão resultados no futuro. A diminuição da maioridade penal é mais rápida, mas como vimos, parece que não traz certeza de solução. Já as outras, além de nunca terem sido tentadas de forma séria, podem transformar para sempre nossa realidade. Mudar para algo mais próximo de países que têm índices de criminalidade juvenil bem mais baixos.
Eis alguns pontos para discussão.
1. Armamento. O revólver que matou o estudante saiu de alguma fábrica, possivelmente brasileira. Somos um dos maiores produtores de armas leves do mundo e a arma que está na mão do bandido hoje, foi lícita ontem. Enquanto conseguir uma arma de fogo for algo corriqueiro, qualquer um terá mais facilidade em cometer crimes. Menor ou não.
2. Educação. Com uma escola que mal consegue manter os estudantes por mais de 3 horas na sala de aula, fica difícil criar perspectivas e abrir horizontes. Escola com tempo integral, com poucos alunos por sala e atividades esportivas e culturais certamente ajudarão a dar ao adolescente mais possibilidades na vida.
3. Família. Pais com subempregos, vivendo em condições desumanas, sem acesso a nenhuma prestação de serviço estatal também são um prato cheio para que os seus filhos cresçam sem perspectivas. Ajuda também se os pais tiverem tempo de educar.
4. Cumprimento das funções do Estado. Nosso Estado falha na maioria absoluta das prestações a que se propõe. Da escola à saúde, passando pelo direito à cidade, o poder público promete muito e faz muito pouco.
5. Efetividade do sistema judicial. Quem advoga sabe que é muito pior não punir do que ter penas brandas. Apesar de ser uma conquista, o ECA é mal aplicado no país. Inclusive, o processo judicial a qual o menor se sujeita não dá a ele nem um direito de defesa sério. Um processo ágil, que garanta o direito a defesa é fundamental para mostrar ao infrator que o Estado não é omisso.
6. Desmistificação midiática. O homicídio não é nem de longe a maior incidência de crimes entre jovens. Aliás, antes de cometer um homicídio, a maioria passou por outros delitos. Para vender jornal, a maioria dos veículos de comunicação espetaculariza o homicídio, não denunciando o caminho que leva a ele. Enquanto esperarmos para se chocar com o fim da linha do jovem em conflito com a lei, seguiremos no mesmo quadro. Jovens não nascem assassinos.
7. Aliás, quem mais morre no país são jovens, negros e pobres. E não como vítimas de assalto. Este ambiente violento certamente dá margem para mais violência. A regra no país é o jovem ser a vítima e não o autor.
Por tudo isso, sugiro o seguinte: que tal melhorarmos a condição de vida de todos antes de termos leis mais severas? Que tal fazer o que todos os países desenvolvidos fizeram antes de debater o aumento da responsabilidade dos jovens?
Mudar meia-dúzia de leis pode até trazer o conforto às famílias das vítimas ou aos conservadores de plantão. Só não muda a realidade ao nosso redor. É mais ou menos aquele sentimento de buscar uma solução mágica para os problemas que nos cercam. Nada mais infantil.

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