Por Stephen Stefani, Médico oncologista
O presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves, decidiu eliminar o limite de reembolso que existia para a assistência médica aos deputados federais. A medida vai na contramão das promessas de economicidade que foram feitas durante a campanha. O significado prático é que basta o deputado apresentar um recibo médico e suas despesas serão integralmente reembolsadas. Seria até adequado, se o resto da população brasileira tivesse a mesma deferência. Os 190 milhões de habitantes têm direito ao sistema público _ SUS _ e somente 20%, portanto próximo a 45 milhões, pagam por um sistema privado suplementar.
Os deputados estão se colocando em um sistema novo. O próprio ex-ministro da saúde José Temporão, no seu perfil na rede social Facebook, condenou o modelo.
O fato chama a atenção para que nenhum dos sistemas de financiamento de saúde do Brasil parece bom. Por um lado, o SUS _ com raras e honrosas exceções _ é subfinanciado e com problemas de gestão. Na outra ponta, temos o sistema privado _ ou planos de saúde _, que, apesar de regulamentados e supervisionados pela Agência Nacional de Saúde (ANS) há uma década, são campeões de reclamações no Procon.
O abismo entre os dois sistemas é muito grande. A estimativa de gastos com saúde no Brasil é de 9,6% do PIB, de acordo com dados da Organização Mundial da Saúde para 2013, publicados na revista The Economist. O problema é que, se contabilizarmos somente os gastos com saúde pública, são menos de 5%, média menor que o continente africano e a maioria dos países da América Latina. Metade, portanto, dos recursos usados em saúde são com 20% da população que tem plano de saúde e, outra metade, com 80% das pessoas que usam o SUS.
Um outro exemplo interessante que ilustra muito bem essa iniquidade se refere ao acesso. O número de aparelhos de ressonância nuclear magnética por 1 milhão de habitantes fica em torno de cinco a seis em países como Canadá, França e Austrália. No Brasil temos 17 aparelhos para cada milhão de pessoas que têm plano de saúde e 2,5 se forem usuários do SUS. Um ponto comum que participa de qualquer análise no setor é que os custos em saúde estão aumentando e as fontes pagadoras, públicas e privadas, estão tendo dificuldades.
Com uma população envelhecendo usando mais remédios e muito mais caros, assolada por uma carga tributária recorde de 34% (enquanto a média mundial para tributos sobre medicamentos é 6%), se criou uma condição preocupante para a medicina. Soluções devem ser debatidas com a mesma agilidade com a qual a Câmara de Deputados se concedeu o benefício de reembolso sem limites. De outra forma, podemos estar rumando para um colapso no setor ou, expressão recorrente no país, um “apagão da saúde”.
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