Um dos mais longevos políticos brasileiros, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), defende uma mudança na lei para regular o comportamento de ex-presidentes da República. "Nós devíamos ter, no Brasil, uma legislação que não permitisse a nenhum ex-presidente da República que voltasse a qualquer cargo eletivo", sugere o político maranhense de 82 anos.
Sarney chegou à Câmara como deputado federal pelo Maranhão em 1955. Nunca mais saiu da política. Passaram-se já 57 anos. Foi presidente da República de 1985 a 1990. Em seguida, fez o que agora não recomenda aos demais: disputou e venceu, pelo Amapá, três eleições sucessivas para o Senado. Em 2015, quando termina seu atual mandato, terá completado 24 anos no Congresso.
Em entrevista ao "Poder e Política", projeto da Folha e do UOL, disse que agora não pretende ser mais candidato a nada. Começa seu rumo à aposentadoria eleitoral no começo de 2013, quando deixa a presidência do Senado. Um pouco melancólico, acha que as "medidas provisórias destruíram o Congresso", mas não enxerga solução no curto prazo. Defende uma mudança no sistema de governo para o parlamentarismo. "Até lá, nós vamos viver baseados na qualidade do presidente da República de manter o país estável".
Sobre sua sucessão no Planalto, em 1989, tem uma avaliação sobre o candidato do PMDB a presidente naquele ano: "O Ulysses cometeu um grande equívoco. O equívoco do Ulysses foi achar que rompendo com o governo ele teria o apoio da opinião pública". A personagem da crítica é Ulysses Guimarães (1916-1992), que naquela disputa ficou com 4% dos votos, rompido com Sarney.
Político moderado e ao longo da carreira posicionado do centro para a direita, Sarney apoiou o governo do petista Luiz Inácio Lula da Silva. Enxergou ali uma forma de ilustrar sua imagem. Lula, conta Sarney, foi três vezes à casa dele para pedir apoio. "Para mim, era muito bom. Durante todo esse tempo de político [eu era] tido como conservador. Eu vi essa possibilidade de nós termos um operário no poder".
Ao deixar a presidência do Senado, no início de 2013, Sarney pretende ter menos compromissos partidários. Quer desfrutar mais de sua "paixão" pelo Maranhão. "É uma saudade que não passa".
Sergio Lima/Folhapress | ||
O presidente do Senado, José Sarney, durante entrevista, em Brasília |
A seguir, trechos da entrevista realizada em 17 de dezembro:
Folha/UOL - Ao assumir a presidência do Senado o sr. disse que talvez fosse a última eleição que disputaria. É isso mesmo?
José Sarney - Uma vez o Virgílio Távora conversando comigo disse [que há] duas maneiras de a gente largar a política militante. Ou quando o povo largava a gente, ou quando a gente larga o povo. Nós temos outra, que é a idade. Eu, na minha idade, não posso jamais pensar em ser candidato novamente ao Senado.
Em 2015 o sr. pendura as chuteiras?
A política só tem uma porta. Disse isso no meu discurso de entrada na Academia Brasileira de Letras. Não tem porta de saída. Não poderei deixar de fazer política, de ser político.
Do ponto de vista político eleitoral?
Do ponto de vista político eleitoral?
Mandatos eletivos não vou ter mais. Também não quero ter atividades partidárias.
O sr. está com 82 anos. Como está a sua saúde?
Muitas vezes olhamos a nossa fotografia, mas não olhamos as nossas radiografias. Graças a Deus, eu estou bem. Não posso me queixar.
E a política brasileira?
O Brasil tem um gargalo a ultrapassar. A sua organização política. Nossas instituições políticas remontam ao século 19. Nós ainda não conseguimos uma estrutura política como aquelas que servem as democracias modernas e que dão estabilidade.
Por exemplo?
Hoje nós ainda estamos com as medidas provisórias. Essas medidas provisórias destruíram o Congresso. Ao mesmo tempo, jogaram nas costas do Executivo uma função que ele não tem. E jogaram nas costas do Legislativo também algumas funções que ele não tem.
A Constituição de 88 transferiu ao Poder Executivo, através das medidas provisórias, a capacidade de legislar.
Então, nem o Congresso funciona na sua plenitude. E, também, o Executivo fica muito dependente dessas medidas. O resultado é que se faz uma legislação circunstancial do dia a dia.
Mas todos os presidentes da República dizem que é muito difícil governar sem o instrumento da medida provisória...
Mas todos os presidentes da República dizem que é muito difícil governar sem o instrumento da medida provisória...
É essa a grande armadilha que foi feita. É porque sem as medidas provisórias, é impossível governar... E com elas, a democracia jamais se aprofundará e as instituições jamais se consolidarão. Quer dizer, o Congresso passou a entrar numa crise que vive até hoje.
De pouco poder?
De pouco poder?
De não legislar. Ele legisla para sancionar aquilo que o Poder Executivo já legislou, porque já está em vigor. As medidas provisórias. É isso que eu chamo de o grande gargalo.
A solução...
No Império, quando a Constituição passou a não funcionar, foi feito um ato adicional. O ato adicional, então, conseguiu estabelecer como funcionaria o regime parlamentarista, criou o conselho de Estado. Ao mesmo tempo, transformou o poder moderador para que o país pudesse realmente funcionar como funcionou.
Em algum momento, nós vamos ter um instrumento dessa natureza. Ou uma constituinte limitada para colocar a Constituição de 88 em termos de tornar o Brasil com uma governança moderna.
A Constituição é híbrida sobre esse ponto. É ao mesmo tempo parlamentarista e presidencialista. Nossa Constituição é tão falha que nós já temos 67 emendas constitucionais. Os artigos que têm nessas emendas são superiores aos artigos da Constituição. E temos em tramitação no Congresso 1.500 emendas constitucionais. E já passaram pelo Congresso nesses anos 3.500 emendas constitucionais.
No caso das medidas provisórias, algum presidente será generoso a ponto de entregar esse poder ao Congresso?
Esse é um ponto que nós temos. É que ninguém abdica de poder.
E como fazer?
Não se faz a reforma política porque todos os que estão em mandatos eletivos pensam que vão perder as condições que os levaram à conquista do mandato. E não se faz a reforma das medidas provisórias porque os presidentes acham que vão perder uma força muito grande.
Quando e como isso será resolvido?
Como todas as coisas de Estado se resolvem. Quando a crise se tornar paroxística.
Não é agora, então?
Não é agora, então?
Não é agora. Confesso que não vejo, numa visão de médio prazo, nenhuma possibilidade de que isto possa ocorrer. Como também eu estou no Congresso há 54 anos e vejo se falar em reforma política todo o tempo. E eu, às vezes, me entusiasmo, até tenho tido várias iniciativas. Digo: "Agora, nós vamos fazer". Mas, evidentemente, quando o assunto entra em marcha, não vai. Não avança.
Quando avançará?
Esse assunto só vai ser resolvido quando nós mudarmos do regime presidencialista para o regime parlamentarista. Eu acho hoje que nós devemos entrar no regime parlamentarista. Por quê? Porque nos momentos de crise, cai o governo. E a estrutura continua estável. Não cria crise. Aqui, no regime presidencial, qualquer crise atinge o próprio governo. Para sair disso, é muito difícil.
No Império, nós tivemos o Poder Moderador. Na República, quando começou a República, começou logo a ter os seus problemas. Primeiro foram as eleições. Como fazer eleições se o povo quer votar no regime monárquico? Chegou ao ponto em que o ministro da Justiça, que era o Campos Sales, fez uma reunião e disse: "Olha, temos que fazer uma legislação para fraudar a eleição".
Foi a chamada República Velha, com aquela legislação em que o Pinheiro Machado ficava na porta do Congresso reconhecendo os mandatos. "Esse é nosso. Entra. Esse é mais ou menos, corta". É isso que aconteceu.
O que deu? Nas crises, as Forças Armadas queriam e assumiram essa função de poder moderador. Elas mesmas diziam ter "destinação histórica" e começaram com as intervenções militares. Essas intervenções militares foram, periodicamente, se manifestando ao longo das crises que se criavam no Brasil.
Numa democracia moderna, amadurecida, essa função de poder moderador é feita nos países parlamentaristas. Países presidencialistas têm muito pouco no mundo hoje. A não ser países autoritários, com ditadores.
Os EUA são uma exceção?
Uma exceção, mas é muito diferente. O sistema americano funciona, mas o Congresso também funciona fiscalizando o Executivo permanentemente. É um regime muito diferente. Realmente, a federação existe. No Brasil, não existe mais a federação.
E como será até chegar o parlamentarismo?
Até lá, nós vamos viver baseados na qualidade do presidente da República de manter o país estável.
Alguma coisa será aprovada no curto prazo do que se chama reforma política?
Duas coisas vão ser aprovadas. Primeiro, o financiamento de campanhas. Isso aí, nós vamos aprovar. Essa é uma parte que vai se fazer.
O que mais?
O que mais?
Proliferação de partidos. Vai se encontrar uma solução porque todos já estão sentindo que é impossível. Principalmente agora que a Justiça decidiu que eles têm acesso imediato ao fundo partidário e à televisão.
Está acontecendo um fenômeno que está matando os partidos grandes. Porque ninguém quer mais concorrer em partido grande. O que todo mundo faz: vendem-se pequenas legendas, fazem esses acordos espúrios em nível baixo. Então, os candidatos que são eleitos têm votação que às vezes correspondem a um terço da votação, ou muito menos do que isso, dos candidatos que foram eleitos nos grandes partidos.
Ainda existe o risco de volta dos militares?
Isso afastamos definitivamente. O Brasil superou essa fase.
E quais valores emergiram no lugar?
Primeiro, estamos atravessando o maior período em que o país já teve de estabilidade constitucional sem nenhum problema, nenhuma ruptura. Funcionou de tal maneira que tivemos até um impeachment de um presidente. E o país caminhou.
A Constituição de 88, se por um lado deu problemas, por outro deu uma estabilidade muito grande que o país necessitava, que foi a sua visão social. Nós entramos com uma visão social e não somente com a visão econômica que tínhamos. Isso fez com que tivéssemos uma paz social. O povo participou mais da riqueza nacional. Nós tivemos essa grande melhoria de vida do povo e alguns valores emergiram. O valor da liberdade. O valor da igualdade. A busca da transparência.
É quase a revolução francesa...
Liberdade, igualdade, também, e fraternidade. Fraternidade o povo brasileiro já tem no fundo. Nós já temos uma massa capaz de manobrar a fraternidade porque, realmente, nós temos uma formação de um povo pacífico.
Mas o patrimonialismo persiste.
Esse é um fenômeno histórico que vem da colônia. Os portugueses vieram para cá não para criar uma nova pátria, mas para enriquecer. Naquele tempo, à custa de quê? A custa do Estado. E voltar para a metrópole.
Ao longo do tempo, essa mentalidade foi a do Estado protetor. O Estado que faz tudo. De onde saem todas as dádivas. Tudo acontece por causa do Estado. Até mesmo hoje isso remanesce. Todo mundo quer uma lei.
É que nós vemos no Congresso. Ninguém sabe quantas leis temos no Brasil. Trezentas mil? Ninguém conhece. Todas buscando proteger, de alguma maneira, alguma coisa. As carreiras. Todo mundo quer estender o seu poder, os seus benefícios. Participar do Estado protetor.
Agora em 2012 o Senado aprovou a regulamentação da profissão de historiador...
Para você ver a que ponto nós estamos chegando. Até profissão de historiador. Quer dizer, agora eu até não sei se estou me excedendo quando escrevo sobre história, não é? [risos].
Além do patrimonialismo na relação com o Estado, há o personalismo na política...
É porque os partidos políticos no Brasil praticamente não existem. Nós não temos uma tradição de partido nacional.
Partido nacional no Brasil foi tratado na Lei Agamenon Magalhães de 1946. Outros países da América Latina tinham partidos centenários. E nós [não]. Por quê? Porque nós tínhamos partidos estaduais. Essa tradição de partido estadual remanesce até hoje.
Se olharmos bem, vamos verificar que os partidos são ainda regionais. Quando os militares assumiram o poder em 1964, acabaram com os partidos. Mas foram obrigados, por essa tradição brasileira e pelas realidades locais, a criar as sublegendas. Que, na realidade, ao invés de ter dois partidos que eles criaram [Arena e MDB], naquele tempo com 23 estados, eles dobraram. As sublegendas se disseminaram e ficaram como partidos.
Quando se fundou o Partido Libertador, foi do Rio Grande do Sul. O Partido Republicano era um partido mineiro. Hoje, os grandes partidos são todos de São Paulo. A partir de São Paulo, nos Estados eles funcionam quase como registradores de candidatos nas eleições. Do PMDB de São Paulo, nasceu o PSDB. O PT é um partido também que nasceu em São Paulo. Se nós estudarmos cada um deles, vamos verificar que a origem é estadual.
Algum partido é mais nacional?
Nenhum.
Nem o PT?
Não. O PT não foi fundado como um partido, mas como uma federação de tendências num mundo ainda profundamente marcado pela ideologia que desapareceu. É difícil o PT ter unidade.
Mas o PT tem um amálgama que é o ex-presidente Lula.
Ele [o PT] tem uma coisa que, no Brasil, os partidos nunca tiveram. Como um partido de massa, ele se transformou num partido da classe operária.
O modelo do PT é de um partido de massa. Baseado muito nos partidos europeus que têm também o seu braço sindical. O PT tem as suas centrais [sindicais] e capacidade de mobilização.
Como foi sua reconciliação com o ex-presidente Fernando Collor?
Nós não tivemos um momento de reconciliação porque, no meu temperamento, eu não gosto de declarar guerra a ninguém. Podem declarar a mim. Mas eu não aceito adversário voluntário. Eu me coloco como se fosse uma terceira pessoa nesses fatos. No caso, nunca tive problema de natureza pessoal com o presidente Collor. No governo, ele me atacou muito. Na campanha ele me atacou muito. Todos eles. Não tive um candidato que me defendesse. Era difícil sobreviver.
Por que Ulysses Guimarães, candidato a presidente pelo PMDB, também partido do sr., não o defendeu em 1989?
O Ulysses cometeu um grande equívoco: achar que rompendo com o governo, ele teria o apoio da opinião pública. Na realidade, nenhum governo em qualquer situação deixa de ter, no mínimo, 20% de apoio na opinião pública.
O Ulysses resolveu que até na convenção proibissem que os candidatos do PMDB subissem com os nossos ministros que eram do PMDB no palanque. Isso foi uma decisão tomada pelo então [candidato à] vice-presidente, Waldir Pires.
Diante disso, o PMDB não podia ter legitimidade popular para atrair os que eram contra o governo. O PMDB tinha sido instituidor do governo. Tinha participado do governo. Participava do governo.
Então, abriu esse espaço. Entrou o PT e entrou o Collor -que não sendo atraído pela parte ideológica, tinha entre todos os outros partidos a opinião nacional, classe média, classe conservadora.
Com essa fragilidade, nas eleições de 89, Lula foi para o segundo turno com 16% do eleitorado. O Ulysses teve 4%. Se ele tivesse tido o nosso apoio, se ele tivesse se integrado às nossas forças, porque eu dei liberdade a todos os meus amigos, os nossos ministros, ele teria no mínimo 20%, 25% e iria para o segundo turno. Inevitavelmente, seria eleito. Ele foi vítima dos seus próprios companheiros.
Ulysses ajudou a cristalizar a fragmentação já existente no PMDB?
O PMDB se fragmentou todo quando ele perdeu a perspectiva de poder. Sabiam todos que o Ulysses não seria eleito, que essa estratégia tinha falido. Então, o PMDB se fragilizou.
Em 1989, Lula e o PT o criticaram. Agora, são seus aliados. O que se passou?
Eu acho que durante a campanha de 89 ele não me atacou tanto pessoalmente. O Collor era muito mais pessoal.
Lula atacava mais o governo. Não tivemos esse embate de pessoa a pessoa.
Não tive nenhuma ligação com o Lula. Mas quando eu escrevia na "Folha de S.Paulo", quiseram fazer uma campanha contra o Lula. Eu era absolutamente adversário do Lula, tinha uns 15 anos depois que eu já tinha deixado o governo. Eu fiz um artigo "A Lula o que é de Lula". Dizendo que ele, sendo um líder operário, não podia ser atacado da maneira como ele estava.
Teve algum momento em que conversaram pessoalmente naquele período?
Nunca conversei pessoalmente com o Lula naquele período.
E no governo Lula?
Olha, dizem assim: "O Sarney está apoiando o governo". Eu nunca saí da minha casa para ir à casa de ninguém e dizer assim: "Eu vim aqui para lhe apoiar". O Lula foi à minha casa três vezes. Na campanha dele. Buscaram o meu apoio em companhia do José Alencar.
A conversa era no sentido de apoiar-lhe. Eu achei que era do meu dever. Para mim, era muito bom. Durante todo esse tempo de político [eu era] tido como um político conservador. Eu vi essa possibilidade de nós termos um operário no poder. De concluir o ciclo republicano com 100 anos da República. Nós saímos dos baicharéis que fizeram a República: Prudente de Moraes, Campos Sales. Já entramos no Rodrigues Alves, que era um dos barões do café e era monárquico. Percorremos os militares que ocuparam [o poder]. E chegarmos a esse período com um operário no poder.
Nenhuma classe brasileira pode dizer que esteve fora das decisões nacionais. Isso me deu a responsabilidade de dizer que eu, apoiando o Lula naquele momento, afastava um pouco o medo que se tinha, nacionalmente, de que o Lula ia fazer uma revolução socialista.
Como seria institucionalmente correto o Brasil cuidar de seus ex-presidentes da República?
Eu acho que nós devíamos ter, no Brasil, uma legislação que não permitisse a nenhum ex-presidente da República, deixando o governo, que ele voltasse a qualquer cargo eletivo.
Devia ser proibido?
Devia ser proibido.
Contrariando, inclusive, a sua carreira, a de Itamar Franco e de vários?
Devia ser proibido. Devia-se dar ao ex-presidente da República as condições para ele exercer as funções do ex-presidente da República.
Quais são elas?
Tendo sido um presidente da República, é detentor de informações muito preciosas. Ele é detentor de uma visão do Brasil, do seu país, em nível internacional, da sua inserção a nível mundial. Pode ser um braço não governamental das negociações em que o governo não pode entrar diretamente, para ser um homem apaziguador. Essa é a função do ex-presidente, como ele exerce nos Estados Unidos. Mas ele tem que ter condições.
Quais condições?
O Estado devia dar-lhe uma pensão de sobrevivência [ao ex-presidente], assegurar um escritório, viagens, segurança permanente. Porque um ex-presidente deixa no governo inimigos, deixa pessoas no mundo dessa natureza.
Hoje um ex-presidente tem direito à segurança e a uma pensão...
Não, pensão não tem. Tem direito à segurança, isso a legislação brasileira assegura. São seis pessoas que formam seu staff. A segurança e mais três assessores.
O Estado paga os salários desse staff?
Desse staff.
O que mais deveria ter?
Exatamente o que tem nos Estados Unidos, não mudaria nada.
Descreva.
Ele [o ex-presidente] tem direito a um escritório. Forma o seu escritório numa repartição pública qualquer. O governo dá a ele, ou ele estabelece o escritório. Dá uma verba anual de representação, paga esses funcionários lá da representação, as pessoas que trabalham lá com ele. Dá condições de mobilidade, dá segurança e dá apoio ao ex-presidente.
Com isso, o [Jimmy] Cárter [ex-presidente dos EUA] viaja o mundo inteiro. O [Bill] Clinton tem feito a mesma coisa. Todos os ex-presidente americanos fazem isso.
Mas por que então o sr. como ex-presidente voltou para a vida eleitoral?
Naquela época em que eu tinha deixado a Presidência, eu não pensava em voltar à política. Mas houve o problema do Collor. Todas as forças políticas que tinham ficado contra mim foram me pedir que eu voltasse. Porque com esse temperamento moderador, do diálogo, de sempre procurar harmonizar conflitos, eles achavam que era importante a minha presença dentro do Congresso Nacional. Eu aceitei voltar para prestar um serviço ao país naquele momento.
Mas não era novidade porque o Rodrigues Alves também voltou. O Itamar Franco, o Getúlio [Vargas], o Juscelino [Kubitschek].
O sr. não aconselharia o seu agora aliado Lula a disputar um cargo em 2014?
Em teoria, eu estou lhe dizendo o que acho que deveria ser a Presidência da República. Mas essas são decisões pessoais, que cada um tem que tomar.
O sr. vê ânimo no Congresso para aprovar algo como o sr. defende?
Não. A primeira coisa que dizem é que não se pode dar privilégio, que considera-se isso privilégio. Mas, na realidade, não é privilégio. O país está investindo nos seus homens públicos, que se deve preservar.
Hoje, 17 de dezembro de 2012, quando estamos gravando esta entrevista, o jornal "O Estado de S. Paulo" publica que está sob censura há 1.235 dias, por decisão judicial, impedido de divulgar dados de uma operação da Polícia Federal que investigou seu filho, Fernando Sarney. Por que esse caso dura tanto tempo?
Os advogados entraram com essa ação. No dia que deu entrada, eu publiquei uma nota dizendo que não concordava. Por quê? Sempre tive a tradição de defender a liberdade de imprensa e todos os seus setores no Brasil.
Mas por que imediatamente não retirou [a ação] então?
Retirou.
Mas demorou para retirar...
Não demorou...
...Alguns meses.
Demorou alguns meses para retirar, mas ele retirou...
O governo anterior do ex-presidente Lula e setores do PT, até hoje, falam sobre a necessidade de haver um "controle social da mídia". O que o sr. acha disso?
Eu sou contra qualquer controle de mídia. Nunca a imprensa foi tão dura com um presidente da República quanto como foi comigo no meu tempo. Mas alguns excessos de liberdade de imprensa são corrigidos pelo tempo.
Cabe ao Senado sabatinar os indicados para o Supremo Tribunal Federal. Essas sessões de sabatina são quase uma homenagem. Como melhorar isso?
É ter uma consciência de quem é indicado para ministro do Supremo Tribunal, como para os outros cargos públicos, deve se submeter ao Senado não como se já fosse ministro, mas como um pleiteante que suas qualidades devem ser julgadas e avaliadas.
Os senadores que fazem parte da comissão, que vão inquirir, devem aprofundar, ter a noção de que ali não está a pessoa que já é detentora do cargo, mas que está sendo sujeita ao seu exame. Eu concordo perfeitamente com você.
Deve se repetir a chapa PT-PMDB com Dilma para presidente e Michel Temer de vice?
Acredito que sim. Eu acho que não há nada que possa dizer que não deva ser. A aliança com o PT e com o PMDB, ela hoje não tem nenhum problema.
O senador Renan Calheiros deseja ser seu sucessor como presidente do Senado. Está trabalhando para conseguir os apoios. Quais são as chances de Renan Calheiros?
Dentro do Senado, nós temos o regimento que manda que a Comissão Diretora da Casa seja constituída com a proporcionalidade dos partidos. Assim, o partido majoritário indica o presidente. E os outros indicam proporcionalmente para os outros cargos. Então é dentro das bancadas que se vai fazer a escolha. Nós devemos respeitar a decisão da bancada. Agora, ele [Renan] é um nome de grande expressão dentro da bancada.
Outros poderiam ocupar a mesma posição?
Não vejo ninguém pleiteando, exceto Renan.
Ao deixar de ser presidente do Senado, como será a sua rotina a partir de 2013?
Você sabe que os homens que viajam no espaço, quando eles entram na atmosfera da Terra, eles vão se adaptando à atmosfera, a essa situação que se cria. De maneira que eu já estou nessa fase, preparando-me para deixar a vida parlamentar, que é muito difícil.
Mas quais são seus planos?
Assim que eu deixar o Senado, que não tiver compromissos partidários, eu acho que é muito difícil eu resistir à paixão de voltar ao Maranhão. É uma saudade que não passa.
Acesse a transcrição completa da entrevista.
A seguir, vídeos da entrevista (rodam em smartphones e tablets):
José Sarney no Poder e Política
Ver em tamanho maior »
O senador e ex-presidente José Sarney (PMDB-AP) participa do programa "Poder e Política - Entrevista", conduzido pelo jornalista Fernando Rodrigues
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