Diego Garcia
Direto de São Paulo
um lado, uma imponente construção orçada em quase R$ 1 bilhão, que movimenta 1500 funcionários 24 horas por dia e tem atraído os olhos do Brasil e do mundo nos últimos anos. Do outro, um amontoado de barracos que abriga exatas 1048 pessoas, todas vivendo em situação precária, muitas delas sem água, luz e quase nenhuma condição de higiene. Assim é a gritante disparidade entre a Arena Corinthians e a Vila da Paz, separados por 500 m de distância.
Semelhança, entre ambos, além da localização no bairro de Itaquera, só o fato de que a simples existência da primeira pode ter mudado para sempre a vida dos habitantes da segunda. A construção do estádio, palco da abertura da Copa do Mundo de 2014, no Brasil, trouxe diversas mudanças na mobilidade urbana da região. Entre elas, a aparição de parques e viadutos obrigava a remoção das famílias instaladas ilegalmente no terreno da Vila da Paz.
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"Vão tirar a gente de um lugar onde tudo é perto. A escola das crianças, o hospital, o mercado, tudo. Para que? Construir uma avenida?", indagou Diana do Nascimento, dona de casa de 37 anos, há duas décadas no local. Quando chegou, inclusive, existiam poucos barracos na Vila da Paz. Hoje, o número aumentou para 377 domicílios, com mais de 300 crianças morando entre os 1048 habitantes divididos em 12.583,66 m² de área, espalhada em cinco setores.
Falta de água e higiene, incêndio e auxílio-aluguel
Uma das líderes da comunidade, Diana explicou à reportagem que o objetivo do governo estadual seria desapropriar todas as famílias até 2014, mas que diversas liminares obtidas pela população junto ao Ministério Público ajudaram a adiar a desocupação para 2016. Contudo, o Setor 1 da Vila da Paz já deve deixar o lugar pelo menos até junho, quando vão se dirigir ao conjunto São Sebastião, no cruzamento da Rua Francesco Calegari com a Rua Frei Antonio Faggiano, que está perto da conclusão
"Ficamos sem água aqui por nove meses. É um sofrimento. Temos que sair durante a madrugada para conseguir tomar banho, lavar roupa, sem contar os ratos, que não saem daqui", disse a moradora Solange Paz, acompanhada pela vizinha Maria do Carmo. "Temos conversado sempre com a vice-prefeita Nádia Campeão e a subprefeitura de Itaquera também tem nos escutado. É duro viver aqui sem água e luz, já que cortaram. Nós não queremos nada de graça, queremos pagar", reclamou Pedro Furtado, 58 anos, líder comunitário. A reportagem procurou a Sabesp para rebater o corte da água, mas não obteve resposta até a publicação da nota. Vale lembrar que, por se tratar de uma comunidade com moradias ilegais, partes da Vila da Paz utilizam "gatos" para ter água e luz.
De acordo com os moradores, o problema começou principalmente após a confirmação de Itaquera como palco da abertura da Copa do Mundo a ser realizada no Brasil. A partir daí, se iniciou a briga para retirar as comunidades do local para conclusão de obras de desenvolvimento urbano, como rodovias e áreas de lazer públicas. O projeto de expansão do Parque Linear é outro que assombra os moradores, que convivem diariamente com o medo de serem despejados.
Por outro lado, governo estadual já avisou que os demais setores da Vila da Paz só serão mesmo retirados futuramente, principalmente após a conclusão das obras do conjunto residencial Iguape B. De acordo com os líderes comunitários, uma das discussões diz respeito à chamada "bolsa-aluguel" proposta pelos políticos paulistanos. "Ainda estão negociando isso", disse Drancy Silva, 53 anos, há vinte na comunidade. "O governo tem verba para o estádio do Corinthians, mas para nos ajudar não tem", reclamou.
Em contrapartida, o diretor da Regional Leste da Secretaria Municipal da Habitação, Felinto Carlos, deu outro parecer sobre o imbróglio “É a primeira vez que vamos realocar uma comunidade desse porte na Zona Leste sem recorrer a expedientes como o auxílio-aluguel. Todas as famílias serão reassentadas até o fim da nossa gestão, no sistema chave a chave e no mesmo distrito”, disse em comunicado.
Ainda restam outros pontos a serem discutidos entre os líderes comunitários e as autoridades. Entre eles, por exemplo, a vontade dos moradores de retirarem também o Setor 5, que fica em um trecho conhecido como "curva da morte", próximo à avenida do Contorno. Localizado na esquina de cruzamento perigoso de Itaquera envolvendo a rua Dr. Luis Aires, já ocorreu até morte no local por acidente automobilístico causado pela falta de segurança. Um incêndio também causou a morte de outro habitante da Vila da Paz.
"Cortaram nosso 'gato' da luz há algum tempo. Aí, tinha gente se virando com velas. Uma delas gerou um incêndio por aqui", explicou um morador. "A gente não quer nada de graça, a gente quer pagar. Mas só que aqui dentro não temos endereço fixo por ser dentro da comunidade, por isso não conseguimos regularizar a situação de água e luz. Tudo isso começou depois que surgiu isso aí da Copa, que a prefeitura não para de vir aqui", reclamou outro habitante.
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