quarta-feira, 16 de abril de 2014

Índios guarani ocupam Pátio do Colégio por demarcação de terras em São Paulo

Povo guarani reivindica do ministro da Justiça José Eduardo Cardozo a assinatura de Portarias Declaratórias que dão sequência à titulação de seus territórios
Por Igor Ojeda e Tatiana Merlino

São Paulo (SP) - Indígenas guarani de aldeias localizadas na Grande São Paulo ocuparam nesta quarta-feira, 16, o interior do Pátio do Colégio, no centro de São Paulo (SP). Eles reivindicam do ministro da Justiça José Eduardo Cardozo a demarcação de suas terras. Os guarani, que afirmaram que passariam a noite no local, ainda permaneciam por lá até a publicação desta matéria. A Repórter Brasil acompanhou a ação.
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Índios guarani tocam, cantam e dançam no interior do Pátio do Colégio. Foto: Caio Castor
Cerca de 50 índios entraram na área interna do Museu Anchieta, localizado no Pátio do Colégio, por volta das 15h30. No pátio coberto da parte de trás do lugar, formaram um círculo e deram as mãos. Revezaram-se em falas em guarani e, aproximadamente vinte minutos depois, deram início a um ritual de música, dança e canto, com o auxílio de instrumentos musicais e sob os olhares de funcionários e visitantes não índios do local. Uma das músicas dizia: “aqueles que são muitos acabaram com tudo que nossos antepassados deixaram para nós”, em referência às ações dos brancos.
Aproximadamente meia hora depois, distribuíram panfletos explicando os motivos da ocupação. De acordo com o comunicado divulgado por eles, “interromper temporariamente as atividades do Museu, que celebra o local de fundação da cidade e início da colonização, foi a forma encontrada pelos habitantes originários de São Paulo para cobrar do Ministério da Justiça a emissão das Portarias Declaratórias que garantem a demarcação das Terras Indígenas Tenondé Porã e Jaraguá, já reconhecidas pela Funai [Fundação Nacional do Índio]“. Por volta das 16h30, o diretor do Museu Anchieta, padre Carlos Contieri, ao ser avisado sobre a pernoite dos indígenas, chamou a Polícia Militar, que enviou três homens. Após alguns minutos de negociação, autorizou a permanência deles no local.
Índios negociam a permanência no local, sob os olhares de policiais militares. Foto. Caio Castor
Índios negociam a permanência no local, sob os olhares de policiais militares. Foto: Caio Castor
ConcentraçãoOs guarani se concentraram na noite do dia 15 na Aldeia Tenondé Porá, na Zona Sul de São Paulo, onde realizaram um ritual de reza, também acompanhado pela Repórter Brasil. De lá, partiram em micro-ônibus no início da tarde desta quarta-feira em direção à região central da cidade. Da praça da Sé, saíram por volta das 15h20 rumo ao Pátio do Colégio. Caminharam devagar, observando os monumentos e edifícios históricos, até chegar ao local da ocupação.
Segundo os organizadores da campanha, basta apenas a assinatura das Portarias Declaratórias pelo ministro José Eduardo Cardozo para que se inicie o processo de indenização dos não índios que habitam os territórios reivindicados pelos indígenas. Em seguida, as terras estariam habilitadas para serem demarcadas e, num momento posterior, tituladas. A reportagem solicitou um posicionamento do ministro da Justiça por meio de sua assessoria de imprensa, mas esta não havia retornado até a publicação desta matéria.
A Terra Indígena Jaraguá, situada na Zona Norte da capital e que segundo a organização da campanha é a menor do Brasil, concentra aproximadamente 700 guarani em 1,7 hectare. Os indígenas protestam também contra uma decisão da Justiça que determina o despejo dos habitantes da aldeia Tekoa Pyau, que fica fora da terra indígena e que seria abarcada pela demarcação do território reconhecido pela Funai, de 532 hectares.
Informação no site da Funai indicando o reconhecimento da Terra Indígena Jaraguá. Imagem: Funai
Informação no site da Funai indicando o reconhecimento da Terra Indígena Jaraguá. Imagem: Reprodução/Funai
A Terra Indígena Tenondé Porã, no extremo sul de São Paulo, abriga cerca de 1.400 índios, em quatro aldeias, duas em Parelheiros, uma em Marsilac e outra no município de São Bernardo do Campo. Hoje, a Funai reconhece que esse território deveria abranger 16 mil hectares (Para pesquisar sobre as terras indígenas existentes no Brasil, clique aqui). De acordo com os guarani, a falta de espaço é a causa principal dos problemas vividos por eles na Grande São Paulo, como alta incidência de doenças, atropelamentos de crianças, e falta de saneamento básico, alimentação e água potável.
Informação no site da Funai indicando o reconhecimento da Terra Indígena Tenondé Porã. Imagem: Funai
Informação no site da Funai indicando o reconhecimento da Terra Indígena Tenondé Porã. Imagem: Reprodução/Funai
A intenção é manter a ocupação até às 16 horas da quinta-feira, 17, para quando está programado o lançamento da campanha “Resistência Guarani SP“, que exigirá do governo federal a demarcação das terras. Para divulgar suas reivindicações, os indígenas publicaram um manifesto em duas versões: uma em texto e outra em vídeo, em sua própria língua (assista ao vídeo abaixo). Além disso, já circula na internet uma petição a ser enviada ao ministro da Justiça.
No manifesto (leia-o na íntegra aqui), os guarani deixam claro que escolheram o Pátio do Colégio por seu caráter simbólico: “é o local onde vocês brancos se fixaram pela primeira vez, e começaram a tomar posse das terras que eram do nosso povo”. Foi nesse lugar que a cidade de São Paulo foi fundada, em 1554, e que se deu início à catequização dos povos indígenas da região. “Nossas terras não são mais aqui no Centro, não são no Pátio do Colégio, pois esse lugar já foi tomado por vocês há muito tempo, e não vamos nunca pedir de volta. Elas são na margem da metrópole, onde vocês ainda não destruíram, onde sobra ainda um pouco das matas onde sempre vivemos”, diz o texto.
No dia 24, a partir das 17 horas, os guarani pretendem realizar um ato com a mesma pauta na avenida Paulista.
Liderança guarani fala durante o ritual de reza realizado na Aldeia Tenondé Porã. Foto: Beatriz Macruz
Liderança guarani fala durante o ritual de reza realizado na Aldeia Tenondé Porã. Foto: Beatriz Macruz

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